quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Sarau Câmara - 34º PAÍSES ANDINOS


Segunda-feira,26, participei de um Sarau da Câmara dos Deputados, organizado pelo meu mestre e professor Marco Antunes e desta vez ganhei um presente para representar; trata-se da "ODE AO GATO" do magistral Pablo Neruda, um dos nossos grandes poetas latinos e que foi laureado com Prêmio Nobel de Literatura.

Segue o poema para apreciação. Acredito que quem ama gatos entrará em êxtase, mas mesmo aqueles que não os ama se encantará com a maestria do poeta:


ODE AO GATO

Pablo Neruda
tradução: Eliane Zagury

Os animais foram imperfeitos,
compridos de rabo, tristes de cabeça.
Pouco a pouco se foram compondo,
fazendo-se paisagem,
adquirindo pintas, graça vôo.
O gato,
só o gato apareceu completo e orgulhoso:
nasceu completamente terminado,
anda sozinho e sabe o que quer.

O homem quer ser peixe e pássaro,
a serpente quisera ter asas,
o cachorro é um leão desorientado,
o engenheiro quer ser poeta,
a mosca estuda para andorinha,
o poeta trata de imitar a mosca,
mas o gato quer ser só gato
e todo gato é gato do bigode ao rabo,
do pressentimento à ratazana viva,
da noite até os seus olhos de ouro.

Não há unidade como ele,
não tem a lua nem a flor
tal contextura:
é uma coisa só como o sol ou o topázio,
e a elástica linha em seu contorno
firme e sutil
é como a linha da proa de uma nave.
Os seus olhos amarelos
deixaram uma só ranhura
para jogar as moedas da noite .

Oh pequeno imperador sem orbe,
conquistador sem pátria,
mínimo tigre de salão,
nupcial sultão do céu
das telhas eróticas,
o vento do amor na intempérie
reclamas quando passas e pousas
quatro pés delicados no solo,
cheirando,
desconfiando de todo o terrestre,
porque tudo é imundo
para o imaculado pé do gato.

Oh fera independente da casa,
arrogante vestígio da noite,
preguiçoso, ginástico e alheio,
profundíssimo gato,
polícia secreta dos quartos,
insígnia de um desaparecido veludo,
certamente não há enigma na tua maneira,
talvez não sejas mistério,
todo o mundo sabe de ti
e pertences ao habitante menos misterioso
talvez todos acreditem,
todos se acreditem donos,
proprietários, tios de gato,
companheiros, colegas,
discípulos ou amigos do seu gato.

Eu não.
Eu não subscrevo.
Eu não conheço o gato.
Tudo sei, a vida e o seu arquipélago,
o mar e a cidade incalculável,
a botânica
o gineceu com os seus extravios,
o pôr e o menos da matemática,
os funis vulcânicos do mundo,
a casca irreal do crocodilo,
a bondade ignorada do bombeiro,
o atavismo azul do sacerdote,
mas não posso decifrar um gato.
Minha razão resvalou na sua indiferença,
os seus olhos têm números de ouro.


Não é lindo? E para quem gosta de gatos indico o blog de um grande amigo mímico, Jiddu Saldanha , que movido pela paixão a esses felinos criou um blog:
http://www.haigatos.zip.net

E ainda fez um lindo filme inspirado nessa "fera independente da casa"

http://www.youtube.com/cinemapoema#p/a/u/0/MlzniSvJaOA

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